
O segundo dia de C6 Fest e último do evento no auditório do Ibirapuera. Na derradeira noite de Jazz, lendas do calibre de Meshell Ndegeocello e Brian Blade se juntaram ao novo talento da cena Kassa Overrall e mostram as mais diversas formas de usar o jazz como uma potência criativa. Dessa forma, com emoções diversas os músicos usaram a arte para mover a plateia.
O C6 Fest começou na última quinta (22/5) e continua até domingo (25) e, a convite do festival, o Correio acompanha os próximos dias que terão shows de Nile Rogers & Chic, Air, Wilco, entre outras grandes atrações.
Jazz com pegada de rap
Quem abriu os trabalhos foi o baterista, produtor e rapper norte-americano Kassa Overrall. O artista é reconhecido por grandes nomes da música como Yoko Ono e mais recentemente integrante da banda de Jon Batiste e trouxe um show que mistura os estudos em jazz com o amor pelo hip-hop.
O músico trouxe para o jazz o rap da rua, com versões instrumentais e complexas de músicas amadas do gênero. O movimento contrário também foi comum no show, com a introdução de elementos, e rimas, do hip-hop no que parecia execuções rebuscadas de jazz. O baterista mostrou que era capaz de por meio da música, e um carisma imenso, aproximar o público de todo tipo de música que fazia.
Porém, mesmo com toda a levada do hip-hop, Kassa formou quinteto que trabalhava o jazz com muita potência. Composto pela bateria do artista, percussão, contrabaixo, piano e saxofone, a banda chamou muita atenção e segurou todo o show em alto nível. Mesmo quando o baterista largava as baquetas e assumia os vocais, era claro que os instrumentistas que o acompanhavam tinham plena capacidade de assumir o protagonismo nas músicas.
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Jazz controlado
Se o jazz de Kassa Overall se mistura a outros gêneros musicais, como o hip-hop, o jazz de Brian Blade e a sua Fellowship Band é firmemente ancorado na tradição. O veterano baterista norte-americano, conhecido por colaborações com grandes nomes do jazz, como Joshua Redman e Brad Mehldau, monta, em seu projeto como líder, um tradicional quinteto de jazz, composto de músicos menos conhecidos pelo público brasileiro, mas não menos talentosos: o pianista John Cowherd, o baixista Christopher Thomas e os saxofonistas Myron Walden e Melvin Butler.
Cada nota tocada parecia reverberar no corpo do baterista. O artista trouxe um quinteto simples de jazz, com piano, bateria, contrabaixo e dois saxofones, mas fez um show muito distante da simplicidade. Até nos momentos mais introspectivos a sofisticação era proposta com sutileza. Com a mesma intensidade que sentia a música, o artista também a controlava.
Se em outros shows a estrela que levava o nome da apresentação deixava todos brilharem, na vez de Brian Blade, ele brilhou muito mais do que o grupo brilhante de músicos que o acompanhavam. Porém, como um bom jogador das trocas do jazz, o baterista não ofuscou ninguém e fez uma performance individual que a todo momento exaltou o grande coletivo com quem dividiu o palco.
O show ainda guardava a surpresa, uma faixa conhecida do público brasileiro. Grande irador da cultura do país, Brian convidou três alunos da escola de música do Ibirapuera — um no pandeiro, um na alfaia e um no berimbau — para juntos tocarem Os escravos de jó, de Milton Nascimento. Em uma versão bonita e grandiosa, celebraram o país que os abraçou com uma ovação.
Jazz com mensagem
O encerramento dos trabalhos do auditório Ibirapuera no C6 Fest de 2025 ficou a cargo de outra lenda: Meshell Ndegeocello, baixista norte-americana de longa carreira no jazz. Ela fez um show distinto, que contou com uma abertura do duo Jake & Abe — projeto paralelo de dois músicos da banda da artista — e um interlúdio poético com um audio em português, mas que musicalmente foi o mais emocionante para a plateia.
Com grandes músicos do jazz na banda, ela caminhou para o soul e R&B, principalmente, graças a presença do intenso e excelente vocalista Justin Hicks, com quem a artista dividiu os microfones. Toda a apresentação foi pensada como uma homenagem ao centenário do escritor James Baldwin. No show Meshell parecia musicar a alma e o sentimento presentes na obra do autor.
Carregado de muita profundidade, o show uniu música e mensagem com maestria. Mesmo com problemas no microfone, a baixista conduziu o público em um eio por uma boa ideia. “Estou elétrica!”, brincou a cantora após tomar alguns choques do microfone.
Com a ajuda de uma talentosa banda, Meshell colocou a cereja no bolo de uma excelente etapa jazz para o público do C6. O festival que, atualmente, se mostra um dos mais preocupados com a experiência musical do ouvinte.
Colaborou Pedro Mesquita