
O cenário da publicidade digital no Brasil, que movimenta quase R$ 38 bilhões anualmente e cresceu 60% nos últimos quatro anos, impõe desafios crescentes a anunciantes e agências, como destacou o diretor de estratégias digitais do Correio Braziliense, Luiz Mendes. Longe de ser um ambiente simples, a era digital exige estratégias mais sofisticadas e um olhar atento não apenas para a tecnologia, mas para o fator humano e a garantia da entrega. Essa foi a tônica do evento CB Talks — O Futuro Digital, uma parceria entre o Correio e a Realize. O encontro reuniu especialistas do setor para analisar o atual momento da publicidade digital e apontar as perspectivas para o segmento.
A principal dificuldade está na crescente complexidade e na disputa pela atenção do consumidor online. “Estamos num momento de aumento de complexidade na publicidade digital”, alertou José Luiz de Genova, diretor regional LATAM da Taboola — plataforma de publicidade nativa que permite a exibição de anúncios em formato de recomendações de conteúdo. Ele descreve o mundo digital como “poluído", onde as pessoas são impactadas por milhares de mensagens publicitárias diariamente, tornando mais difícil alcançar o retorno sobre investimento.
Diversificação
Diante desse desafio, a resposta não é apostar em um ou dois canais apenas. A saída estratégica sugerida durante o evento é a diversificação do mix de marketing digital — combinação estratégica de ferramentas e canais online para atingir objetivos de marketing. Segundo Genova, “diversificar o mix de marketing é fundamental”, pois isso reduz a dependência de um único canal, diminui o risco, alcança consumidores em momentos diversos e tem potencial para aumentar a eficácia das campanhas.
“Acho que é inegável que existe um hábito, um costume das agências, das marcas, de trabalhar com o que é mais, digamos assim, normal para o dia a dia. Quando falamos de plataforma, falamos de redes sociais, da Meta, da Google, que é o meio do dia a dia. Mas quando você multiplica esse mix de marketing, você reduz a dependência de um canal, você reduz o seu risco, você alcança esses consumidores em momentos diversos dessa jornada dele”, explicou o especialista.
Ele reforçou que essa diversificação deve ser inteligente, buscando ambientes que ofereçam Brand Safety — segurança para a marca não aparecer em conteúdos inadequados — e, de forma mais proativa, Brand Suitability — estar em contextos relevantes e positivos que combinem com a mensagem da marca.
Luiz Mendes frisou a diferença de veicular anúncios em veículos com “seriedade naquilo que a gente apura (se referindo ao ambiente da redação jornalística)” e plataformas onde o controle de conteúdo é menor, ressaltando que um ambiente de qualidade é “fundamental para que a gente possa oferecer para as marcas que ele faça uma associação correta”.
Relações de afeto
Porém, ir além das métricas básicas e da diversificação de canais tradicionais também significa olhar para o futuro e para o próprio ser humano. Júlia de Castro, co-CEO do Catraca Livre — plataforma online de conteúdo digital que divulga cultura, eventos, cidadania e serviços, com foco em eventos gratuitos ou com preços íveis —, trouxe a visão de que o futuro da mídia e do branding a pela construção de "relações de afeto" e “comunidades” baseadas em "propósito".
Para ela, a autenticidade deixa de ser um selo e vira um bem que gera desejo. Dessa forma, o valor se move para a criação de propriedades intelectuais que nascem dessas comunidades engajadas, gerando receita por outras vias que não apenas a venda de espaço publicitário. “A gente vai ter que estudar muito mais royalties no futuro do que necessariamente métrica de mídia”, apontou a especialista.
Por sua vez, o diretor nacional de comercialização multiplataforma do Grupo Record, Paulo Itabaiana, destacou que o futuro da tecnologia e da publicidade não reside apenas nos avanços técnicos, mas na compreensão da “questão humanística” e do contexto social.
Ele observou que grande parte do conteúdo de eventos de inovação foca na sociedade, no comportamento humano e nos desafios que a tecnologia impõe, como a solidão ou a dependência das telas. A verdadeira conexão digital, para ele, exige olhar além dos dados demográficos e entender a identidade e o comportamento profundo das pessoas, reconhecendo que “o que mais nos diferencia é o fato de sermos humanos, o fato de termos empatia”.
Resultados reais
Em meio a estratégias complexas e visões de futuro que valorizam a conexão humana, surge a necessidade imperativa de garantir que o investimento gere resultados reais. É aqui que entra o papel, muitas vezes subestimado, do adserver, sistema responsável por auditar e controlar a entrega dos anúncios. João Paulo, da sócio-fundador da Media Brasil e Space Adserver, posicionou o adserver como o garantidor essencial, especialmente no setor público, onde as regras são mais estritas.
“Para você trabalhar para o governo, para você ser um veículo e atender o governo, você tem que ter uma série de critérios que às vezes são deixados de lado. Mas o adserver serve para quê? Garantir que o mínimo que o governo contratou seja entregue”, afirmou.
João Paulo explicou que o adserver atua na linha de frente contra problemas que corroem o investimento: fraude, combatendo o tráfego gerado por robôs que “consomem” publicidade pela qual alguém paga; a verificação do local exato onde o anúncio apareceu, garantindo que a marca não esteja em páginas inadequadas ou irrelevantes; e lidando com a dificuldade de entregar segmentações excessivamente restritivas e irrealistas pedidas pelas agências. Ele também é fundamental na gestão da Lei Geral de Proteção de Dados, assegurando o uso correto dos dados.
Na questão da transparência, João Paulo explicou que o adserver fornece relatórios e dashboards, e a evolução caminha para o uso de Interfaces de Programação de Aplicações que dão aos clientes o direto aos dados de entrega para sua própria análise. As métricas também evoluem do simples registro de uma “impressão”, o mercado ou a exigir a viewability — métrica que determina se um anúncio online foi realmente visto por um usuário, e não apenas exibido —, que garante que o anúncio foi visível na tela do usuário, sendo pelo menos 50% por 1 segundo. Há um movimento, segundo o especialista, para que se pague apenas por “impressões visíveis”, uma métrica mais justa para o anunciante.
*Estagiário sob a supervisão de Carlos Alexandre de Souza