
Três meses antes de virar papa, Robert Prevost discordou publicamente do vice-presidente americano, JD Vance, sobre a interpretação de um conceito da tradição católica que ele usou durante uma entrevista para justificar a ideologia America First ("América primeiro") defendida por Donald Trump.
"Tem um conceito cristão que expressa que você ama sua família, depois ama o próximo, depois ama sua comunidade, depois ama seus concidadãos e, depois disso, prioriza o resto do mundo. Boa parte da extrema esquerda inverteu completamente isso", afirmou Vance à Fox News em 29 de janeiro.
Em 3 de fevereiro, Prevost compartilhou no X (antigo Twitter) um artigo de opinião publicado no National Catholic Reporter com o título "JD Vance está errado: Jesus não nos pede para hierarquizar nosso amor pelos outros".
Até o momento, o post teve 29 mil compartilhamentos e 71 mil curtidas, e segue gerando engajamento.

Quando foi publicado, três meses atrás, o assunto já havia se tornado um grande bate-boca na internet.
No dia seguinte à entrevista da Vance, um professor se manifestou no X classificando a perspectiva como "uma visão bizarra de João 15:12-13" e alertando que deveria gerar preocupação "quando políticos agem como teólogos, presumem falar por Jesus e nos dizem em que ordem amar".
Ao que Vance, que se converteu ao catolicismo em 2019 e se descreve no X como "cristão, marido, pai", respondeu: "Procure 'ordo amoris' no Google".
A partir daí, os internautas foram prolíficos em interpretações sobre o conceito, com católicos mais conservadores defendendo o republicano e os mais liberais discordando dele.

No texto compartilhado por Prevost, a articulista afirma que "ordo amoris" surgiu na Idade Média, sendo comumente atribuído a São Tomás de Aquino. Ela argumenta que a ideia foi desenvolvida dentro da lógica da escassez do período medieval e que erroneamente alimenta o mito de que algumas pessoas são mais dignas de cuidado e atenção do que outras.
"Mas Jesus nunca fala de amor como algo que deva ser racionado. Ele fala de amor como abundância — uma mesa onde há o suficiente para todo mundo", prossegue o texto
Dez dias depois, o cardeal compartilhou outro post sobre o assunto, desta vez da publicação America The Jesuit Review, intitulada "A carta do papa Francisco, o 'ordo amoris' de JD Vance e o que o Evangelho nos pede em relação à imigração".

O artigo faz menção a uma carta enviada pelo papa Francisco aos bispos dos Estados Unidos em resposta à política de deportação em massa da gestão de Trump e afirma que nela o pontífice havia claramente rejeitado a interpretação de Vance no trecho "O amor cristão não é uma expansão concêntrica de interesses que pouco a pouco se estendem a outras pessoas e grupos".
O articulista aponta ainda que muitos eleitores de Trump são católicos e votaram nele, entre outras razões, por sua agenda de deportações em massa, e argumenta que a visão do republicano em relação à imigração e aos migrantes "é totalmente diferente do que é ensinado pela igreja".
E conclui: "O Evangelho não oferece uma carta sobre como legislar em relação à imigração. Ele oferece um padrão sobre até onde devemos ir para amar o próximo e uma recusa em aceitar os limites com os quais podemos nos sentir confortáveis ??em relação a quem é esse próximo. A questão que precisamos responder é se julgamos a política de acordo com o Evangelho ou o contrário".
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