Opinião

Juventude negra precisa ocupar espaços de poder

A juventude negra estar na construção de políticas públicas é uma ferramenta fundamental para as mudanças do Brasil e, além disso, para a institucionalidade política

Antes da assinautura da lei Áurea, em 3 de maio de 1888, cerca de seis leis abolicionistas foram sancionadas -  (crédito: Caio Gomez)
Antes da assinautura da lei Áurea, em 3 de maio de 1888, cerca de seis leis abolicionistas foram sancionadas - (crédito: Caio Gomez)

Daniel Loureiro Magnavita da Silvaestudante, diretor estadual de Assistência e Permanência Estudantil da União Estadual dos Estudantes da Bahia (UEES)

As desigualdades sociais do Brasil colocam a classe trabalhadora, principalmente os negros e as negras deste país, em situação de maior vulnerabilidade diante de amarras históricas — desde o período da escravidão e após. Ainda hoje, é negada a cidadania plena a essa parcela que constitui a maior parte da população brasileira. Nós, jovens, negros, latinos, ousamos dizer que, neste século 21, é contraproducente aceitar que ainda haja a não inserção da maioria de um povo nas institucionalidades.

Nas últimas duas eleições — nacional e municipais —, o Brasil contabilizou a obtenção de título de eleitor por milhares de jovens, aumentando significativamente sua presença no quadro eleitoral. Por exemplo, em relação a 2020, a nossa participação foi 78% maior, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). No entanto, há uma lacuna em aberto: a falta de estrutura dos partidos políticos para furarmos a bolha e entrarmos nas institucionalidades, enquanto juventude negra brasileira. É nítida a carência de recursos específicos para candidaturas jovens, em especial negros e negras, filhos e filhas da classe trabalhadora, que não contam com a herança do capital político e financeiro de familiares.

Seria coincidência, ou não, que são esses mesmos que não têm a herança eleitoral e financeira que constroem e atuam nas pautas de interesse da maioria da população? Seria por acaso que esses jovens são os que estão atuando na União Nacional dos Estudantes(UNE), que estão na linha de frente dos sindicatos e na Central Única dos Trabalhadores (CUT)? Nada de coincidência ou acaso, pois são esses, principalmente, que estão nas comunidades, nas esquinas, que lutam e têm sede de justiça social.

Cabe à juventude negra discutir a escala 6x1, a "uberização" do mercado de trabalho, salientar o questionamento do entregador de iFood que leva comida na portaria de um prédio, mas, por vezes, não tem o que comer em casa. A funcionária doméstica que precisaria deixar o(a) filho(a) em uma creche pública, mas, devido à ausência do Estado, não encontra vaga. A carência de mais oportunidades de primeiro emprego. O sucateamento da educação. Esses são alguns dos temas e realidades que só nós, ocupando as casas legislativas, poderemos tratar com propriedade, pois é uma realidade cotidiana para muitos e muitas de nós, juventude negra. 

Do Amapá ao Rio Grande do Sul, nos extremos do país, existe um chamado de luta em curso. É preciso centralizar a juventude negra no combate ao racismo estrutural, na linha de frente da democracia e do Estado Constitucional de Direito, e só iremos conseguir isso com plenitude estando nos espaços legislativos: Congresso Nacional, assembleias estaduais e nas câmaras municipais, trazendo as reais pautas das comunidades, periferias, favelas, subúrbios. 

Talvez, só quem consiga falar verdadeiramente de fome ou de situação de rua seja quem, de fato, já ou por isso ou acompanha essa realidade de mais perto. Talvez, só quem já sentiu na pele algumas dores geradas pelo dito capitalismo selvagem entenda bem como é que a corda pesa mais sobre a população negra e periférica deste país.

O pesquisador Richard Santos cunhou o termo "maioria minorizada", que identifica a maior parte da população, em acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e que se torna minorizada pelo menor o ao poder econômico, estruturas socioculturais, educação, mídias tradicionais.

Falar dos temas, das pautas, mobilizar, ir às ruas, ocupar o espaço público com atividades, nós sabemos! Mas, como disse no início, é quase impossível chegar a estar vereador/a, a estar deputado/a, sem recursos dos partidos que sejam específicos para a juventude, em especial para pretos e pretas. 

Precisamos fortalecer jovens lideranças e incentivar a participação política, inclusive nos partidos políticos, para chegar ao objetivo maior, que é fortalecer a periferia e suas representações, pois acreditamos que é possível, assim, melhor identificar quais as principais demandas nas áreas de saúde, educação, cultura e cidadania, por exemplo.

A juventude negra estar na construção de políticas públicas é uma ferramenta fundamental para as mudanças do Brasil e, além disso, para a institucionalidade política. Eleger mais jovens é um objetivo dessa geração. Por isso, fazemos e estamos na política. Nós, jovens negros e negras, queremos e podemos atuar para construir um país mais justo, menos desigual e com representações políticas mais diversas. 

  

Por Opinião
postado em 19/04/2025 06:00
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