
» MARGARIDA SALOMÃO, Prefeita de Juiz de Fora e secretária-geral da Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos (FNP)
» RODRIGO NEVES, Prefeito de Niterói e vice-presidente de Relações Internacionais da FNP
No Brasil e no mundo, temos assistido ao crescimento na oferta de políticas públicas e no protagonismo das cidades na formulação e pactuação com governos regionais e centrais. Autoridades locais reivindicam a construção e o aprimoramento de ambientes institucionalizados de permanente diálogo entre os diferentes níveis de governo, com o objetivo de definir responsabilidades, acompanhar a execução de políticas e, evidentemente, garantir seu financiamento adequado.
Mas como assegurar um diálogo institucional eficaz se as cidades são tão numerosas e diversas — seja do ponto de vista populacional, econômico, geográfico e cultural? E como tomar frequentes decisões que envolvem milhares de autoridades locais? É justamente por isso que o papel das associações e redes de municípios — regionais, nacionais e até globais — se torna cada vez mais estratégico e amplamente reconhecido.
Cidades grandes, médias e pequenas têm demandas diferentes — e isso se reflete diretamente em como elas se articulam politicamente. Enquanto municípios menores costumam se associar com base no princípio de "um município, um voto", cidades mais populosas tendem a buscar redes que considerem seu peso demográfico, econômico e político. A lógica é compreensível: um prefeito de uma megalópole dificilmente participará de uma assembleia onde sua cidade tem o mesmo peso que um município com poucos habitantes.
Não é um problema de vaidade, mas de coerência com a complexidade da gestão pública. As metrópoles concentram a maior parte da população, do Produto Interno Bruto (PIB) e dos desafios sociais do país. Ainda assim, isso não diminui a importância dos pequenos municípios, que também enfrentam suas legítimas urgências.
No Brasil, essa diferença levou à formação de duas grandes associações de representação municipal: a Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos (FNP), que representa as cidades com mais de 80 mil habitantes — onde vivem dois terços da população brasileira e se produz cerca de 75% do PIB nacional —, e a Confederação Nacional de Municípios (CNM), com forte presença dos municípios menores.
Esse arranjo não é exclusividade brasileira. Nos Estados Unidos, a National League of Cities (NLC), fundada em 1924, engloba vilas, vilarejos e pequenas cidades, mas conta também com filiação formal de grandes cidades. Já a United States Conference of Mayors (USCM), quase centenária, é a associação focada nas cidades com mais de 30 mil habitantes, com forte influência na definição de políticas públicas nacionais.
Na Alemanha, a Associação Alemã de Cidades e Municípios reúne as 11 mil pequenas e médias cidades do país, enquanto a Associação de Cidades Alemãs conecta as 200 maiores. Berlim, por exemplo, está associada às duas redes, mas atua efetivamente na segunda.
No México, a Conferência Nacional de Municípios agrega associações regionais e um maior número de cidades, e a Associação de Cidades Capitais reúne as capitais regionais. Na Austrália, situação semelhante: a Australian Local Government Association (ALGA) representa todos os governos locais e a Council of Capital City Lord Mayors (CCCLM), os líderes das capitais e de cidades como Sydney e Melbourne.
Mesmo em países não federados, como Holanda e França, os arranjos são parecidos. A Associação de Municípios Holandeses (VNG) representa as 358 cidades do país, mas isso não impede a coexistência harmônica com o Grupo das 4 (G4), formado pelas cidades acima de 200 mil habitantes: Amsterdã, Roterdã, Haia e Utrecht. Na França, que possui mais de 30 mil municípios, a Association des Maires de (AMF) reúne cidades de todos os portes, enquanto a Urbaine congrega Paris e as principais cidades sas.
A coexistência de associações distintas, que refletem e organizam as vozes da diversidade dos territórios, potencializa e fortalece a capacidade de representação de prefeitas e prefeitos. É um sinal de maturidade democrática, pois o modelo policêntrico afasta quaisquer pretensões hegemônicas. A complementaridade dos arranjos políticos democratiza a representação, amplia o alcance político das pautas urbanas e evita a centralização excessiva, além de conferir ainda mais legitimidade à atuação institucional assertiva e suprapartidária, viabilizando uma atuação harmônica, cooperativa e complementar.