
Durante a sessão da Câmara Municipal de Natal que aprovou a concessão de título de cidadão natalense ao ex-presidente Jair Bolsonaro, a vereadora Thabatta Pimenta (PSol) sofreu ataques transfóbicos vindos de cidadãos que acompanhavam a votação. Apoiadoras do antigo chefe de Estado, as pessoas que proferiram falas de cunho discriminatório estavam insatisfeitas com o voto contrário da parlamentar à proposição.
Filmadas pela assessoria da psolista, as ofensas, que se deram durante o discurso da vereadora, enfatizavam de forma pejorativa o fato de ela ser uma mulher trans. “Pelo menos eu sou mulher”, disse uma das cidadãs. “Ela é mulher? Não é, eu sou. É a biologia. Quem não acredita em Deus, tem a biologia.”
“Chora, mulher do Paraguai”, esbravejou um homem. “Tem os dois sexos, macho e fêmea.” A vereadora registrou um Boletim de Ocorrência e o caso é investigado pela Polícia Civil do estado.
Nas redes sociais, onde compartilhou os registros, a parlamentar explica a situação. “Criminosos é o que eles são”, escreveu. “Bolsonaristas não aceitam o meu não ao título de cidadão natalense concedido mais uma vez a Bolsonaro e me atacam com falas criminosas.”
De acordo com o discurso de Thabatta, o voto contrário dela à concessão do título era devido, entre diversos motivos, a atos do ex-presidente refletirem na realidade dela, como mulher trans e como alguém que perdeu uma pessoa importante para a covid-19. “Eu não voto porque eu tenho a minha vivência, eu sei o que eu ei”, afirmou. “O show (referindo-se aos ataques) começou exatamente porque eu disse que não votava.”
A vereadora também menciona que representa “famílias e pessoas que perderam alguém na pandemia”, uma vez que Bolsonaro foi alegadamente omisso em relação à compra de vacinas e gestão de crise durante o período. “Na época, de quem eu perdi, eu sabia quem era o presidente que estava lá. O presidente que estava lá é exatamente este que está sendo colocado para ganhar o título de cidadão natalense.”
“O que esse senhor fez para Natal?”, questiona ela. “Meu voto é o voto ‘não’ de tantas outras pessoas que reafirmam o voto ‘não’ a um senhor desse ser natalense (...). É um voto contrário não só meu, mas de pessoas que perderam um ente querido numa pandemia que coloca este senhor como um genocida.”
Thabatta critica o fato de a Câmara Municipal estar focada em conceder títulos a personalidades políticas como Jair e Michelle Bolsonaro e Nikolas Ferreira em vez de “focar nos reais problemas de Natal, como UPAs lotadas, educação e o transporte público sucateado”.
“Pode aprovar, pode não aprovar, mas o voto da travesti numa proposição dessa, ele (Bolsonaro) não tem”, finalizou. “Vocês queiram ou não, eu estou aqui para representar o povo e pessoas que também não concordam com o título de cidadão natalense para esse senhor.”
Ao fim da votação, a proposta foi aprovada por 19 votos a favor, cinco contra e uma abstenção. A homenagem já havia sido aprovada anteriormente, em abril, mas foi anulada por decisão judicial, por isso a segunda sessão a respeito do assunto. Foram retiradas de pauta, devido à repercussão dos ataques, votações para a concessão de títulos também à ex-primeira dama Michelle Bolsonaro e ao deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), que estavam previstas para esta semana.
Em sessão posterior à que sofreu os ataques, a parlamentar afirmou que a Câmara ignorou o episódio e “fingiu que nada aconteceu”. Em outra publicação nas redes, a equipe da psolista pede ajuda para identificar as pessoas que proferiram as falas de ódio. “Se você tem informação de quem são essas pessoas que fizeram falas criminosas contra a vereadora Thabatta Pimenta, ligue agora mesmo para as autoridades. Na Câmara Municipal não consta registros de quem são essas pessoas (mas deveria ter)”.
Em nota replicada pelo portal Uol, a Câmara de Natal informa que toma, junto a órgãos competentes, “todas as providências necessárias para a apuração rigorosa dos acontecimentos, com a identificação das pessoas envolvidas e a consequente adoção das medidas istrativas e legais cabíveis”.
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Crime inafiançável, a transfobia é enquadrada como injúria racial no Brasil desde agosto de 2023. A pena para o delito é de dois a cinco anos de detenção.
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